A
pouca chuva registrada no semiárido nordestino desde o ano passado pode
comprometer já a produção de 2014. O rebanho de gado, cabras e ovelhas
tem diminuído bastante, seja porque os animais morreram de fome ou
porque a venda foi inevitável.
De Taperoá a Santa Cecília e de Queimadas a Serra Branca. Muda a localidade, mas não muda o impacto da seca que deixa a terra rachada, a carcaça jogada e o açude sem água. A pouca chuva é um elemento comum nos quatro municípios da Paraíba.
Não é de hoje que o Nordeste brasileiro sofre com a seca. A paisagem cinza por conta da falta de água pode até não ser novidade porque todo ano tem seca pela região. A diferença é que dessa vez, a situação resolveu ser mais duradoura e não deu tempo de a vegetação se recuperar. A seca de 2012 praticamente se encavalou com a de 2013, o que deixou a realidade ainda mais crítica.
O criador Luiz Gonzaga de Holanda, do município de Serra Branca, na região do Cariri, viu a diminuição do rebanho de ovelhas com a falta de comida. Os animais que restaram estão bem abaixo do peso ideal. “Tinha um rebanho de 120 ovelhas. Eu tive que vender no início da seca 50%. Um animal, por exemplo, que valia R$ 120,00, nós chegamos a vender a R$ 60,00”, diz.
Na propriedade é possível encontrar outras marcas deixadas pela seca. “Uma das árvores mais resistentes que temos é a algaroba. Dificilmente morre um pé de algaroba. Já morreram várias algarobas com a seca. Era para estar verde, mas, infelizmente, algarobas velhas morreram”, diz o Gonzaga de Holanda.
Para continuar resistindo, os outros produtores da região tiveram que recorrer ao que restou da caatinga para dar de comer aos animais. O xiquexique é uma das plantas da caatinga que tem mais espinho. Alguns deles chegam a ter o tamanho de um dedo e são muito duros. Quando o agricultor tem que transformar a planta em alimento para o rebanho é porque a situação ficou muito crítica.
Desde quando a seca apertou, o trabalhador rural Martinho Lutero não passa um dia sem preparar o xiquexique para as ovelhas do criador Luiz Gonzaga de Holanda. Depois de cortar uma parte da planta, ele coloca fogo no xiquexique para eliminar os espinhos. Os animais só comem o xiquexique depois que ele já estiver esfriado.
A intensidade dessa seca fez com que muitos proprietários escolhessem uma área para jogar as carcaças dos animais que morreram de fome. O cemitério é um local onde o caseiro Francisco das Chagas frequenta com frequência. “De 138 animais, 36 a gente perdeu. Trabalhei mais trazendo animais para o cemitério do que em outras atividades da fazenda”, diz.
Em Taperoá vive um dos criadores mais respeitados do Nordeste quando o assunto é a convivência com o semiárido. O criador Manelito Dantos faz um trabalho de preservação de cabras e ovelhas adaptadas a região Nordeste do Brasil. O conhecimento do seu Manelito sobre o que criar e o que plantar transformou a fazenda dele em um exemplo de como lidar com as adversidades do sertão.
Nas anotações do seu Manelito, que acompanha os índices pluviométricos da propriedade desde a década de 70, a chuva de 2012 foi de 163 milímetros. A estiagem desse ano, até agora, não passou dos 120, quando o esperado eram seiscentos milímetros. “O maior prejuízo da seca é o que deixa de nascer. Os animais para se preservar suspendem o cio”, diz.
Foi o que aconteceu com o rebanho de gado de leite, como conta Joaquim Dantas, um dos filhos do seu Manelito. “Em um ano normal, no mês de janeiro, que é o que mais nasce bezerro aqui, nascem entre 60 e 70 bezerros. Esse ano, por causa de 2012, em janeiro de 2013 só nasceu um bezerro”, diz.
Sem nascimentos, a produção de leite também despencou. “Está em torno de 10% a 15% do que a gente tinha antes. A coisa está se repetindo para 2014. A produção só vai se equilibrar em 2015 se o ano que vem chover”, completa Dantas.
Se há falta de comida no campo, porque a pastagem está rapada, há falta de comida também no barracão que armazena o feno.
No município de Queimadas, no agreste nordestino, a paisagem está verde com os 350 milímetros que choveu desde o início do ano, mas o volume é metade do esperado para a região. A pastagem se recuperou bem na propriedade do agricultor Alberto Rodrigues, mas não deu para segurar o rebanho. “Tinha 60 carneiro e eu tive que vender 50. Vendi e 15 dias depois começou a chuva. Me arrependi muito, mas só que na hora você não tem o que fazer. A chuva desse ano não deu para fazer água. A gente está vendo ração, mas água não foi feito”, lamenta.
"Fazer água", como diz o agricultor, significa basicamente chover o suficiente para encher os açudes sem que o criador tenha que desembolsar de R$ 80,00 a R$ 100,00 para levar um caminhão de água até a propriedade.
Na sede da Emater, em Campina Grande, o coordenador regional da instituição José Sales Júnior, fulano fez um balaço da seca. “Existe uma estimativa a partir da última campanha de vacinação contra febre aftosa de maio e junho de 2013, onde aproximadamente 300 mil animais não foram declarados na vacina. Então, existe uma hipótese de que dentro desses 300 mil animais também exista uma mortalidade”, diz.
Na luta constante com a seca, o agricultor nordestino vem se adaptando a cada ano para poder conviver com a natureza da região. Para isso, é preciso disposição para aprender e absorver as lições que a própria caatinga tem para dar
O agricultor Augusto Batista e genro Marcos da Silva, do município de Santa Cecília, cortam pela primeira vez a maniçoba para fazer feno para o gado. O que era considerado planta daninha se tornou uma riqueza.
“Pelo teor de proteína, a maniçoba substitui tranquilamente a soja. Tendo ou não chuva, ela vai nascer”, diz Ailton dos Santos, agrônomo da Emater/PB.
Por ser parente da mandioca, ou macaxeira como se diz na região, a maniçoba também contém o ácido cianídrico e não pode ser fornecida in natura aos animais. Por quatro cinco dias, ela precisa secar a pleno sol para o ácido evaporar não prejudicar a saúde do rebanho.
A maniçoba passa a ser mais um recurso de convivência com a seca porque viver em uma região onde a chuva é incerta exige estratégias constantes no dia a dia do agricultor.
G1 PB
De Taperoá a Santa Cecília e de Queimadas a Serra Branca. Muda a localidade, mas não muda o impacto da seca que deixa a terra rachada, a carcaça jogada e o açude sem água. A pouca chuva é um elemento comum nos quatro municípios da Paraíba.
Não é de hoje que o Nordeste brasileiro sofre com a seca. A paisagem cinza por conta da falta de água pode até não ser novidade porque todo ano tem seca pela região. A diferença é que dessa vez, a situação resolveu ser mais duradoura e não deu tempo de a vegetação se recuperar. A seca de 2012 praticamente se encavalou com a de 2013, o que deixou a realidade ainda mais crítica.
O criador Luiz Gonzaga de Holanda, do município de Serra Branca, na região do Cariri, viu a diminuição do rebanho de ovelhas com a falta de comida. Os animais que restaram estão bem abaixo do peso ideal. “Tinha um rebanho de 120 ovelhas. Eu tive que vender no início da seca 50%. Um animal, por exemplo, que valia R$ 120,00, nós chegamos a vender a R$ 60,00”, diz.
Na propriedade é possível encontrar outras marcas deixadas pela seca. “Uma das árvores mais resistentes que temos é a algaroba. Dificilmente morre um pé de algaroba. Já morreram várias algarobas com a seca. Era para estar verde, mas, infelizmente, algarobas velhas morreram”, diz o Gonzaga de Holanda.
Para continuar resistindo, os outros produtores da região tiveram que recorrer ao que restou da caatinga para dar de comer aos animais. O xiquexique é uma das plantas da caatinga que tem mais espinho. Alguns deles chegam a ter o tamanho de um dedo e são muito duros. Quando o agricultor tem que transformar a planta em alimento para o rebanho é porque a situação ficou muito crítica.
Desde quando a seca apertou, o trabalhador rural Martinho Lutero não passa um dia sem preparar o xiquexique para as ovelhas do criador Luiz Gonzaga de Holanda. Depois de cortar uma parte da planta, ele coloca fogo no xiquexique para eliminar os espinhos. Os animais só comem o xiquexique depois que ele já estiver esfriado.
A intensidade dessa seca fez com que muitos proprietários escolhessem uma área para jogar as carcaças dos animais que morreram de fome. O cemitério é um local onde o caseiro Francisco das Chagas frequenta com frequência. “De 138 animais, 36 a gente perdeu. Trabalhei mais trazendo animais para o cemitério do que em outras atividades da fazenda”, diz.
Em Taperoá vive um dos criadores mais respeitados do Nordeste quando o assunto é a convivência com o semiárido. O criador Manelito Dantos faz um trabalho de preservação de cabras e ovelhas adaptadas a região Nordeste do Brasil. O conhecimento do seu Manelito sobre o que criar e o que plantar transformou a fazenda dele em um exemplo de como lidar com as adversidades do sertão.
Nas anotações do seu Manelito, que acompanha os índices pluviométricos da propriedade desde a década de 70, a chuva de 2012 foi de 163 milímetros. A estiagem desse ano, até agora, não passou dos 120, quando o esperado eram seiscentos milímetros. “O maior prejuízo da seca é o que deixa de nascer. Os animais para se preservar suspendem o cio”, diz.
Foi o que aconteceu com o rebanho de gado de leite, como conta Joaquim Dantas, um dos filhos do seu Manelito. “Em um ano normal, no mês de janeiro, que é o que mais nasce bezerro aqui, nascem entre 60 e 70 bezerros. Esse ano, por causa de 2012, em janeiro de 2013 só nasceu um bezerro”, diz.
Sem nascimentos, a produção de leite também despencou. “Está em torno de 10% a 15% do que a gente tinha antes. A coisa está se repetindo para 2014. A produção só vai se equilibrar em 2015 se o ano que vem chover”, completa Dantas.
Se há falta de comida no campo, porque a pastagem está rapada, há falta de comida também no barracão que armazena o feno.
No município de Queimadas, no agreste nordestino, a paisagem está verde com os 350 milímetros que choveu desde o início do ano, mas o volume é metade do esperado para a região. A pastagem se recuperou bem na propriedade do agricultor Alberto Rodrigues, mas não deu para segurar o rebanho. “Tinha 60 carneiro e eu tive que vender 50. Vendi e 15 dias depois começou a chuva. Me arrependi muito, mas só que na hora você não tem o que fazer. A chuva desse ano não deu para fazer água. A gente está vendo ração, mas água não foi feito”, lamenta.
"Fazer água", como diz o agricultor, significa basicamente chover o suficiente para encher os açudes sem que o criador tenha que desembolsar de R$ 80,00 a R$ 100,00 para levar um caminhão de água até a propriedade.
Na sede da Emater, em Campina Grande, o coordenador regional da instituição José Sales Júnior, fulano fez um balaço da seca. “Existe uma estimativa a partir da última campanha de vacinação contra febre aftosa de maio e junho de 2013, onde aproximadamente 300 mil animais não foram declarados na vacina. Então, existe uma hipótese de que dentro desses 300 mil animais também exista uma mortalidade”, diz.
Na luta constante com a seca, o agricultor nordestino vem se adaptando a cada ano para poder conviver com a natureza da região. Para isso, é preciso disposição para aprender e absorver as lições que a própria caatinga tem para dar
O agricultor Augusto Batista e genro Marcos da Silva, do município de Santa Cecília, cortam pela primeira vez a maniçoba para fazer feno para o gado. O que era considerado planta daninha se tornou uma riqueza.
“Pelo teor de proteína, a maniçoba substitui tranquilamente a soja. Tendo ou não chuva, ela vai nascer”, diz Ailton dos Santos, agrônomo da Emater/PB.
Por ser parente da mandioca, ou macaxeira como se diz na região, a maniçoba também contém o ácido cianídrico e não pode ser fornecida in natura aos animais. Por quatro cinco dias, ela precisa secar a pleno sol para o ácido evaporar não prejudicar a saúde do rebanho.
A maniçoba passa a ser mais um recurso de convivência com a seca porque viver em uma região onde a chuva é incerta exige estratégias constantes no dia a dia do agricultor.
G1 PB
Nenhum comentário:
Postar um comentário